Um pouco de tudo que vi
Carlos Cartaxo
A vida passa
como um sopro, em uma velocidade estonteante; às vezes suave dando tempo para
ser admirada; outras em uma rapidez imperceptível que nem a mente consegue
acompanhá-lo. Pois bem, outro dia eu tinha a inexperiência de um adolescente de
15 anos cheio de sonhos, fantasias e rebeldia, pensando que sabia tudo e por
isso mesmo, era o dono da verdade e com projeto de ser do mundo; logo após, um
homem de 30 anos, um aprendiz da vida; um escolhedor de momentos que pensava
ter a sorte como desenhista do seu rumo; hoje, um senhor com 60 anos, um
aprendiz que tem um conjunto de imagens gravadas na consciência e seladas no
inconsciente, crédulo de que precisa refletir e se transformar para evoluir,
enquanto há tempo, nessa rápida passagem material pela vida. Esse processo
evolutivo é geométrico e inevitável. Portanto se faz necessário amadurecimento
para se evoluir com sabedoria.
A coleção de
passagens e vivências, pelas quais vivi, é tão grande que nem a mente consegue
listá-las. Mesmo assim, como uma nuvem passageira que paira sobre mim
permitindo que a sombra se aloje na memória para refrescá-la, cito algumas
imagens que foram marcantes, por isso, hoje significantes para meu grau de
compreensão do mundo e determinantes para meus valores morais, éticos e
afetivos.
A vida é muito
mais universal do que se pensa. Em minhas andanças pelo mundo tive o sabor de
conhecer lugares e pessoas que trago comigo como se fossem um adendo que não
larga os neurônios da aprendizagem. Em novembro de 2017, eu caminhava pelas
ruas de Boston, Estados Unidos da América, quando me deparei com alguém que
tentava se esconder do frio como se este fosse um perseguidor implacável. O
interessante é que essa pessoa não me percebeu, não sabe de minha existência;
hoje não sei da sua, mas ela está presente na minha consciência como uma chama
que não se apaga e que, por muitas vezes, me trás à realidade para perceber o
sentido da vida e compreender meu eu e o em torno de mim. Essas descobertas são
afirmações necessárias à vida em sociedade. Alguns encontros na vida são muito
mais significativos que jantares e almoços, chiques e agradáveis, que merecem
até postagem nas redes sociais como auto-afirmação do significa a felicidade. É
assim que vejo e enxergo o mundo; não basta ver, faz-se necessário percebê-lo.
Foto: Carlos Cartaxo
O encontro com
esse cidadão, que prefiro chamá-lo de personagem, me impõe um grau altíssimo de
ponderação sobre a amplitude da sensibilidade humana. A indignação toma conta
do meu ser quando percebo que a invisibilidade desses personagens urbanos, que deveriam
ser tratados como cidadãos, no máximo, não passa de um artigo esporádico de
jornal. A imagem da cena retina na minha memória e o, conseqüente, tratamento
dado a ela é a tradução mais cabível a sociedade do espetáculo tão bem tratado
por Guy Debord no seu livro “A sociedade do espetáculo”.
Eu sou
obrigado a reconhecer que o mundo continua virado de cabeça para baixo ou que o
mundo está pirado, como sempre o foi. O fato é há discordâncias nessa ordem
preestabelecida que leva a instabilidade humana na terra. É incontestável que o
ser humano evoluiu e que a questão do relacionamento entre pessoas, entre
pessoas e meio ambiente e/ou entre serres vivos na sociedade deixou de ser uma
questão pessoal para ser social. Apesar dessa compreensão harmônica sobre a
vida, há comportamentos muito distantes e divergentes que provocam um completo
reconhecimento da irracionalidade humana. Nesse caso somos induzidos a
compreender que a resiliência é compreendida como um conceito real e necessário
á humanidade porque ratifica de forma correspondente a teoria da ação e reação.
Infelizmente muitas pessoas que ainda pensam que dormem em berço esplêndido,
não se deram conta de que agressões, desrespeito, descaso, indolência é uma
doença social fruto da ausência de amor ao próximo e que, a resiliência se
encarrega de devolver essa energia desfigura para seu emissor.
No mesmo
período e sob o mesmo frio também encontrei em Nova Iorque, o centro mundial do
consumo, que o diga o “show” que é a “Time Square”, pessoas brancas pedindo
ajuda nas esquinas movimentadas da metrópole das compras. É um caso esporádico?
Não me compete quantifica o fenômeno, me compete qualificar. Não defendo o
positivismo para entrar na lógica da meritocracia. Defendo o amor e seu
instrumento sagrado da solidariedade como elo forte que nos faz humanos e
racionais. Enquanto houver uma só injustiça na face da terra, exploração
desmesurado do ser humano, agressões e desrespeito transformo a luta pela vida
justa e amável em imagens que porto na consciência e no coração.
Foto: Carlos Cartaxo
Minha
dramaturgia publicada nos livros “Teatro de Atitudes”, “Teatro Determinado” e “Geraldeando”
expressa bem meu compromisso como educador e escritor no que concerne a defesa
de uma sociedade justa, igualitária e solidária; são peças teatrais e
experiências cênicas que resultaram de criações fruto de tudo que eu vi na
minha trajetória de vida; são visões que interpretam a lógica que justifica a
defesa de propagar sempre o amor, pode parecer piegas, mas o amor constrói.
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