Romance A família Canuto

Romance A família Canuto
Romance A família Canuto e a Luta camponesa na Amazônia. Prêmio Jabuti de Literatura.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Crítica de Domingos Meireles sobre meu livro A FAMÍLIA CANUTO

Crítica de Domingos Meireles sobre meu Livro A FAMÍLIA CANUTO


Anatomia da resistência no latifúndio amazônico

Domingos Meirelles*

Ao resgatar a tragédia que se abateu sobre o clã dos Canuto no Sul do Pará, Carlos Cartaxo produziu um relato comovente de uma das páginas mais sórdidas da vergonhosa história do latifúndio na região amazônica: o confronto desigual e perverso entre os grandes fazendeiros e os trabalhadores rurais que lutam para sobreviver, num ambiente desapiedado e hostil, onde o código gelatinoso das leis se orienta mais pelo tilintar das moedas do que pela boa aplicação do direito.

Nessa terra de ninguém, onde os interesses econômicos se amancebam com a impunidade e a corrupção, é que trafega a narrativa romanesca de Cartaxo, em sua denúncia social sobre os crimes cometidos no rastro do destrambelhado processo de ocupação da Amazônia promovido pelos governos militares, a partir de 1964. Com um texto claro e contundente, despojado de arabescos literários, mas com sabor de romance, o autor nos conduz pela trilha de esperanças que João Canuto percorreu, do interior de Goiás ao Sul do Pará, onde seus sonhos foram enterrados junto com ele.

O tom romanesco que perpassa as páginas do livro, onde a mistura de jornalismo e literatura tem o compromisso de realçar a denúncia das misérias do campo, não compromete o caráter documental da obra; ao contrário, imprime ao relato de Cartaxo extraordinária dimensão humana, sem que ele se deixe contaminar pela criação de heróis bem construídos, criados ou revelados em narrativas semelhantes, como é comum no gênero. Os personagens que recolheu entre as muitas desgraças que povoam Rio Maria foram reconstituídos com alma, carne e ossos, sem que o autor lhe conferisse uma aura que os singularizasse como “seres excepcionais”. Cartaxo não forjou mitos – ele fala apenas de homens e mulheres, gente pobre do campo que não se curvou diante da opressão e do arbítrio. Com a precisão e a clareza de uma aula de anatomia, ele expôs as misérias e grandezas de uma família de camponeses que se transforma num exemplo de resistência diante da espoliação dos fazendeiros da região.

Em sua maioria representantes de uma burguesia emergente e arrogante, vinda de outros lugares, os grandes proprietários não suportam a coragem, a determinação e a altivez dos Canuto – João, a mulher Geraldina e os filhos ainda adolescentes. Acusado de invadir fazendas, quase todas latifúndios improdutivos, em companhia de posseiros expulsos de outras roças, Canuto atrai o ódio dos novos ricos empenhados em aumentar seu patrimônio a qualquer preço na floresta amazônica. Em Rio Maria, havia ainda outro bom motivo para que essa oligarquia moderna, “cria da ditadura militar”, detestasse a presença de Canuto naquele lugar: ele era também um dos mais ativos militantes do PC do B na região.

Numa tarde escaldante de dezembro de 1985, João Canuto foi tocaiado e morto por dois pistoleiros de aluguel com 14 tiros à queima roupa, um deles na cabeça, um pouco acima da sobrancelha direita. Foi morto na rua, para que todos vissem. A multidão compungida, que acompanhou seu corpo pelas ruas, entoava hinos religiosos e cantava a música Pra Não Dizer que Não Falei das Flores, de Geraldo Vandré. Canuto foi enterrado no novo cemitério de Rio Maria, onde a maioria das covas abriga centenas de posseiros, vítimas como ele, da violência no campo.

A cena do enterro é uma das páginas mais comoventes do livro. Nas faixas que seguiam à frente do cortejo, lia-se uma palavra de ordem: “Reforma Agrária, Já!” Na floresta de estandartes e galhardetes, que seguia o caixão, viam-se bandeiras do PC do B e do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Rio Maria.

O fazendeiro mandante do crime foi solto através de habeas corpus. Os assassinos foram também contemplados com o mesmo benefício. Libertado, o mandante deixou a região, cumpriu breve exílio voluntário em Goiás, e quando o caso esfriou, retornou a seus afazeres, no Sul do Pará.

O Processo foi engavetado e ninguém foi condenado. A família Canuto ainda perdera mais dois filhos, executados a mando do latifúndio. Em 93, permaneci dez dias em Rio Maria produzindo um Globo Repórter. Então, pude entender porque a violência e a impunidade se apossaram daquela região.

O livro de Cartaxo é um comovente libelo contra a barbárie no campo.

* Jornalista, apresentador do programa “Linha Direta” da Rede Globo, e escritor, autor de “As Noites das Grandes Fogueiras – Uma História da Coluna Prestes”, entre outras obras.

Resenha publicada na Revista “Saber” , Ano I – Nº 3, julho/agosto 2001, p. 31.

Anatomía de la resistencia en el latifundio amazónico

Domingos Meirelles*

Al rescatar la tragedia que se abatió sobre el clan de los Canuto en el Sur de Pará, Carlos Cartaxo produjo un relato conmovedor de una de las páginas más sórdidas de la vergonzosa historia del latifundio en la región amazónica: el enfrentamiento desigual y perverso entre los grandes hacendados y los trabajadores rurales que luchan para sobrevivir, en un ambiente desapiedado y hostil, donde el código gelatinoso de las leyes se orienta más por el tintinar de las monedas que por la buena aplicación del derecho.

En esa tierra de nadie, donde los intereses económicos se amancebam con la impunidad y la corrupción, es que trafega la narrativa romanesca de Cartaxo, en su denuncia social sobre los crímenes cometidos en el rastro del destartalado proceso de ocupación de la Amazonia promovido por los gobiernos militares, a partir de 1964. Con un texto claro y contundente, despojado de arabescos literarios, pero con sabor de novela, el autor nos conduce por la trilla de esperanzas que João Canuto recorrió, del interior de Goiás al Sur de Pará, donde sus sueños habían sido enterrados junto con él.

El tono romántico que perpassa las páginas del libro, donde la mezcla de periodismo y literatura tiene el compromiso de realzar la denuncia de las miserias del campo, no compromete el carácter documental de la obra; al contrario, imprime al relato de Cartaxo extraordinaria dimensión humana, sin que él se deje contaminar por la creación de heróes bien construidos, creados o revelados en narrativas semejantes, como es común en el género. Los personajes que recogió entre las muchas desgracias que pueblan Río Maria habían sido reconstituidos con alma, carne y huesos, sin que el autor le confiriese una aura que los singularizase como “seres excepcionales”. Cartaxo no forjó mitos – él habla sólo de hombres y mujeres, gente pobre del campo que no se curvó delante de la opresión y del albedrío. Con la precisión y la claridade de una clase de anatomía, él expuso las miserias y grandezas de una familia de campesinos que se transforma en un ejemplo de resistencia delante de la espoliação de los hacendados de la región.

En su mayor parte representantes de una burguesía emergente y arrogante, llegada de otros sitios, los grandes propietarios no soportan el coraje, la determinación y la altivez de los Canuto – João, la mujer Geraldina y los hijos todavía adolescentes. Acusado de invadir caseríos, casi todas latifundios improductivos, en compañía de posseiros expulsados de otras rozas, Canuto atrae el odio de los nuevos ricos empeñados en aumentar su patrimonio a cualquier precio en el bosque amazónica. En Río Maria, había todavía otro buen motivo para que esa oligarquía moderna, “cría de la dictadura militar”, detestase la presencia de Canuto en aquel lugar: él era también uno de los más activos militantes del PC de la B en la región.
En una tarde escaldante de diciembre de 1985, João Canuto fue tocaiado y muerto por dos pistoleros de alquiler con 14 tiros a la quema ropa, uno de ellos en la cabeza, un poco arriba de la ceja derecha. Fue muerto en la calle, para que todos viesen. La multitud compungida, que acompañó su cuerpo por las calles, entonaba himnos religiosos y cantaba la canción Para No Decir que No Hablé de las Flores, de Geraldo Vandré. Canuto fue enterrado en el nuevo cementerio de Río Maria, donde la mayoría de las cuevas alberga cientos de posseiros, víctimas como él, de la violencia en el campo.

La cena del entierro es una de las páginas más conmovedores del libro. En las fajas que seguían a la frente del cortejo, se lía una palabra de orden: “Reforma Agraria, Ya!” En el bosque de estandartes y galhardetes, que seguía el ataúd, se veían banderas del PC de la B y del Sindicato de Trabajadores Rurales de Río Maria.

El hacendado mandante del crimen fue suelto a través de hábeas corpus. Los asesinos fueron también contemplados con el mismo beneficio. Liberado, el mandante dejó la región, cumplió breve exilio voluntario en Goiás, y cuando lo caso enfrió, retornó a suyos quehaceres, en el Sur de Pará.

El Proceso fue encajonado y nadie fue condenado. La familia Canuto todavía había perdido dos hijos más, ejecutados a mando del latifundio. En 93, permanecí diez días en Río Maria produciendo un Globo Periodista. Entonces, pude entender porque la violencia y la impunidad se adueñaron de aquella región.

El libro de Cartaxo es un conmovedora libelo contra la barbarie en el campo.

* Periodista, presentador del programa “Línea Directa” de Rede Globo, y escritor, autor de “Las Noches de las Grandes Hogueras – Una Historia de Coluna Prestes”, entre otras obras.

Reseña publicada en la Revista “Saber” , Año I – N º 3, julio/agosto 2001, p. 31.


Anatomy of the resistance in the amazonian large estate

Domingos Meirelles *

When rescuing the tragedy that was lowered on the clan of the Internode in the South of Pará, Carlos Cartaxo produced a stirring story of one of the most squalid pages of the shameful history of the large estate in the amazonian region: the unequal and perverse confrontation between the great landowners and the rural workers who fight to survive, in a desapiedado and hostile atmosphere, where the gelatinous code of the laws orients more by tintinar of the currencies that by the good application of the right.

In that no-man's land, where the economic interests amancebam with impunity and the corruption, is that trafega the romanesca narrative of Cartaxo, in its social denunciation on the crimes committed in the sign of the destartalado process of occupation of the Amazonia promoted by the military governments, as of 1964. With a clear and forceful text, undressed of arabesque literary, but with novel flavor, the author leads us by beats it of hopes that João Internode crossed, of the interior of Goiás to the South of Pará, where their dreams had been buried he along with.

The romantic tone that perpassa the pages of the book, where the mixture of journalism and Literature has the commitment to heighten the denunciation of the miseries of the field, does not jeopardize the documentary character of the work; on the contrary, it prints to the story of extraordinary Cartaxo human dimension, without it lets itself contaminate by the heróes creation or constructed, created or revealed in similar narratives, as it is common in the sort. The personages who gathered between the many misfortunes that populate Maria River had been reconstituted with soul, meat and bones, without the author conferred a dawn to him that distinguished them like "exceptional beings". Cartaxo did not forge myths - he speaks only of men and women, poor people of the field that was not curved in front of the oppression and of the will. With the precision and claridade of an anatomy class, it exposed the miseries and greatnesses of a family of farmers who transforms itself into an example of resistance in front of espoliação of the landowners of the region.

To a large extent representing of an emergent and arrogant bourgeoisie, arrival of other sites, the great proprietors do not support the anger, the determination and arrogance of the Internode - João, the still adolescent Geraldina woman and children. Defendant to invade small villages, almost all unproductive large estates, in company of posseiros expelled from other clearing, new Internode attracts the hatred of the rich ones pawned on whatever the cost increasing his patrimony in the amazonian forest. In Maria River, there was still another good reason so that that modern oligarchy, "raises of the military dictatorship", detested the presence of Internode in that place: it was also one of the most active militants of the PC of the B in the region. In a late escaldante one of December of 1985, João Internode was tocaiado and died by two gunmen of rent with 14 shots to it burns clothes, one of them in the head, a little arrives of the right eyebrow. He was dead in the street, so that all saw. The compungida multitude, that accompanied its body by the streets, intoned religious hymns and sang the song Not to say that I did not speak of the Flowers, of Geraldo Vandré. Internode was buried in the new cemetery of Maria River, where most of the caves it lodges hundreds of posseiros, victims like him, of the violence in the field.

The supper of the burial is one of the most stirring pages of the book. In the strips that followed the forehead of the courtship, an order word embroils: "The Agrarian Reformation, Already" In the forest of standards and galhardetes, that followed the coffin, flags of the PC of the B and the Union of Rural Workers of Maria River were seen.

The mandante landowner of the crime was loose through hábeas corpus. The assassins also were contemplated with the same benefit. Released, the mandante left the region, it fulfilled brief exile voluntary in Goiás, and when case cooled it, it returned to his tasks, in the South of Pará.

The Process was boxed and nobody was condemned. The family Internode still were lost two children more, executed to control of the large estate. In 93, I remained ten days in Maria River producing a Globe Journalist. Then, I could understand because the violence and impunity were appropriated that region.

The book of Cartaxo is a stirring libel against the barbarism in the field.

* Journalist, presenter of the program "Reporting line" of Nets Globe, and writer, author of "the Nights of Great Bonfires - a Comoon History Prestes", among other works.

Review published in the Magazine "To know", Year I - N º 3, julio/agosto 2001, p. 31.

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